segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A Adorável Vida de Catarina I

    Era carnaval em 2004 e havia acabado de chover, por que no carnaval chove, sempre chove. Deviam fazer um carnaval por semana no sertão do Ceará pra ver se resolvia o problema da seca. Enfim, chovera.
     Ela comera um lanche e ainda mastigava o ultimo pedaço quando encontrou alguns conhecidos da escola, ninguém muito importante, mas como não tinha muita companhia (as amigas sumiram, no carnaval pessoas desaparecem) seguiu seu caminho com os conhecidos.
     Tinha o Bonito, que tinha quase dois metros de altura e era mesmo bem bonito, conversa vai, conversa vem, ela mal engoliu o lanche e ele colocou-a num banquinho, deu-lhe um beijo daqueles desesperados e depois levou-a em casa. Catarina era bem tonta nessa época, beijava e pensava em casamento, mesmo no meio do carnaval, eles tinham combinado de se ver no outro dia e se viram mesmo, junto com o grupo de conhecidos assim não tão conhecidos, saíram pela cidadela, cantando marchinhas e o dia foi acabando e o Bonito com aquela cara linda de paisagem, passou o dia enrolando a Catarina, quando foi de noite ela se deu conta que era carnaval e foi tomar um rumo. Nunca mais viu o Bonito.
    Era carnaval em 2012 e Catarina, na mesma cidadela de sempre, andava com muitos amigos. Foi dançando pela rua, quando um dos amigos apontou, enlouquecido, para a multidão "Olha ali, gente, meu ex-namorado!" e a Catarina olhou de lado, a cidadela tinha ruas apertadas, o encontro foi inevitável. 
       Já iam muitas horas bebendo Maria Mole, então ela precisou olhar bem, olhar direito, que era pra ter certeza que não estava tendo uma alucinação alcoólica. Mas a vida é mesmo uma brincalhona de primeira! E não era que o ex namorado do amigo era o mesmo Bonito do carnaval de 2004? Pobre Catarina! Passou a noite morrendo de rir de si mesma!
      Era meio de ano em 2012 e a Catarina agora era uma adorável professorinha serelepe que dava aulas para adultos ingratos numa escola qualquer do centro da cidadela. Chegou para trabalhar num dia de chuva, o cabelo escorrendo umidade do tempo, a roupa molhada nas beradas, tudo ia bem, e ela viu na secretaria o bendito Bonito ( que agora podia ser chamado de Bonita. Ou linda. Ou diva. Ou ahazo. Ou aloka. Ou pelo próprio nome também, dependendo da preferência) sentado, fechando matricula. Ele não a viu passar e nem ela queria que ele a visse. Estava um pouco sem graça também, melhor evitar a fadiga! Mas no final de dez minutos a secretária bate na porta de sua sala "Tem aluno novo, Catarina!" e lá estava o Bonito, que não sabia onde enfiar a cara de vergonha.... Catarina por sua vez, com sua mania de ser espertinha, foi anotar o nome do novo aluno na lista de chamada"Você é o Bonito, não é?" e ele afirmou imerso em timidez, por que em seu intimo rezava para que Catarina não lembrasse de seu rosto, mas ela era conhecida por ter uma ótima memoria ( sabia contar, nos mínimos detalhes, tudo que acontecera no dia 17 de abril de 1997, mesmo essa sendo uma data irrelevante em sua vida) e não o havia esquecido. O moço era mesmo muito bobo. Vergonha de que? Se fosse esperto teria feito amizade com Catarina e os dois iriam ao cabelereiro juntos pro resto da vida! Mas ao invés disso, depois de duas aulas nunca mais apareceu no curso! Quanta bobagem...




   "Essa historia é ficção. Qualquer semelhança com nomes, fatos ou lugares terá sido mera coincidencia."

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Agora eu já sei...

São Paulo, 19 de setembro


         O passado é mesmo muito engraçado. Por que ele simplesmente é algo que não é mais. E o mais engraçado é como as coisas acabam se desvinculando, como as coisas acabam mudando, como as coisas acabam se resignificando. Eu gosto dessa palavra, ela é tão completa de sentido, e tão cheia de experiência, tão carregada de coisas e pessoas, tão repleta em si mesma daquilo que fazemos todos os dias. Resignificar. Bem ou mal, é rotina, bem ou mal é a vida.
             Ultimamente eu tenho observado as coisas e as pessoas e o refrão continuo é "ah, entendi!" por que muita coisa mudou, na verdade tudo, e quando digo tudo, é tudo mesmo, num sentido muito mais amplo que a mudança simples de endereço.
             Eu nunca fui de fato uma pessoa compreensiva. Nunca me esforcei para isso, por que as coisas sempre me pareceram tão fáceis e tão bem encaixadas que não necessitava entender ninguém ao meu redor. Tudo me vinha pronto. Agora eu entendo como é. Agora eu já sei.  
         Eu tinha sonhos, por que todo mundo tem, mas eles eram distantes, isso me matou por dentro um bom tempo, mas agora eu sei o que é tê-los nas mãos, tocá-los e dizer "É meu esse sonho, e ele está aqui agora todos os dias" e ele está mesmo, todo dia, quando meu despertador toca e eu acordo cansada, com preguiça, pra pegar metrô lotado e atravessar a cidade de ônibus, pra conseguir ter aula na escola que escolhi.  Agora eu sei por que há a perseverança, por que não é todo dia que um sonho se torna palpável, não é todo dia que ele está ai, ao alcance das mãos, agora eu entendo o sacrifício, as horas despendidas em livros, a procura desesperada, mais ainda,  a ausência de tranquilidade, e ausência de compreensão de quem ainda não passou por todo esse processo.
              Minha relação com dinheiro nunca foi nada demais, sou mesmo assim meio solta na vida e você sempre soube disso, na verdade, agora eu já sei, porque isso te deixava ás vezes em profundo desespero, por que dinheiro falta, ele some, quando vem de outrem e a idade já vai avançando maior o desespero em querer guardá-lo, fazê-lo render, agora eu já sei. 
                E ai, eu, que já sei agora tanta coisa, descubro que nunca soube porra nenhuma na vida. Mas eu pude aprender, olha só que coisa, com o pouco que sabia, e agora eu já sei como não ser. Meu sonho está palpável, meu dinheiro está escasso, mas apesar de tudo eu não me tornei egoísta, agora eu já sei. De tanto medo de ficar assim perdida e desesperada, eu entendi, mas isso na verdade sempre soube, algumas pessoas não podem ser usadas como válvula de escape, envoltas em vidros de segurança a serem quebrados em dias ruins. Eu tenho as mesmas condições e outras percepções. Não é uma coisa de louco a cabeça do ser humano?
                Eu me canso e corro, deixo pra trás bobagens, deixo pra trás futilidades, que a vida urge em seguir em frente com aquilo de bom que me tem dado, agora eu já sei e isso me faz feliz, agora eu já sei como ser e como não ser, sei como era e como não voltarei, aprendi também, esse mundo, eterno carnaval, o desprendimento necessário, o valor do descartável, tudo isso eu aprendi.
    E, como já disse, gosto de quem ando sendo, e senti que devia te dizer todas essas coisas por que sei de tudo e cada vez que as experiências se repetem eu vejo novamente aquelas cenas, não sem uma pitada de remorso, poderia ter gritado menos e ouvido mais, humildade não me falta, mea culpa, questão de consciência apenas. Então guarde seu ego e possíveis conjecturas numa mala velha e jogue-a no rio. Junto com meu remorso. Por que nenhum desses sentimentos leva ninguém a nada. Não se pode mudar o passado, tampouco me interessa recuperá-lo. O fato é que entendi, finalmente entendi.  E não há que se preocupar com tudo que foi dito, tudo que saiu de sua boca e me chegou aos ouvidos, não era mesmo tudo verdade? Acusando-me, acusavas a si mesmo, cometemos esse crime juntos, cada um com culpas diferentes. Por isso eu digo que entendo. Finalmente entendo.


                                      saudações cordiais                                                                                      Daniele Andrade

                                                     

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Aniversário do Rodrigo

     
( Som na caixa que é hora de nostalgia... por onde anda o Roxette?)


     Todo ano, quando vem setembro (fresco e ensolarado), eu fico me perguntando se ao invés de ir aquele aniversário, eu tivesse ido para Minas, no casamento dos meus primos, como tencionava a principio. E tudo teria sido diferente, e tudo teria sido, mal ou bem, nada o mesmo, ouviria falar daquela festa, mas seriam lembranças dos outros. 
      Primeiro de setembro de dois mil e um. Eu fui a uma festa com minha prima. Antes, ela alisou meu cabelo com chapinha (pela primeira vez!) e eu ficava jogando ele de um lado para o outro impressionada com aquela nova tecnologia! 
    A festa começou as sete, o aniversariante fazia quinze anos e ganhou 450 cds da trilha sonora de "Um Anjo Caiu do Céu",  eu fiquei duas horas no banheiro olhando meu cabelo novo no espelho, minha prima olhou pra um cara num dos cantos da festa e disse "não gosto dele, por que ele me empurrou na fila da cantina semana passada", tocava Milk and Toast and Honey, eu fui perguntar pro cara por que ele tinha empurrado minha singela prima, tinha um videokê também (por que era moda nas festas da época), ele pediu desculpas pra Carol e no final das contas virou minha grande paixão da adolescência. 
        Eu achava me apaixonar a coisa mais brilhante da vida, cheguei da festa e me demorei a dormir.  Olhando para o teto de madeira do quarto na casa da minha avó, me senti muito mulher por estar apaixonada pelo cara que tinha conhecido horas atrás. Eu tinha treze anos .
       Desde então, todo ano, quando chega Setembro, tenho expectativas idiotas, como se o mês viesse abençoado por alguma magia que fará com que tudo dê certo. Minha pele não terá espinhas, todos os dias serão de sol, vai ventar no meu cabelo o tempo todo e eu ganharei uma viagem com tudo pago para a Irlanda, com direito a show do Westlife e cerveja grátis em todos os pubs de Dublin!
        Eu tenho essa mania de amor platônico. Paixonites curtas me inspiram, me fazem fugir a cabeça no metrô lotado às seis da tarde. Algumas das minhas amigas já nem levam mais a sério quando chego contando sobre como conheci o homem da minha vida, por que isso acontece uma vez por semana. No fundo eu também sei que não há de ser nada.  É sentir pelo simples prazer de sentir, se eu for uma pessoa que não sente nada eu não escrevo nada, e é melhor que eu escreva, pois não há nada que eu faça de melhor nessa vida, mesmo que não sejam coisas assim tão boas, é um habito que não conseguiria viver sem. No mais, na grande maioria das vezes, minhas paixões não vão além do plano das idéias, viram contos, e o objeto da paixão não toma nem conhecimento de tudo que se passa. 
Uma outra prima minha certa vez aos sete anos ouviu a expressão "amor platônico" e quando perguntei a ela o que significava ela responde "platônico é uma bolha!" e todos riram. De qualquer forma, foi uma ótima metáfora!

      Esse discernimento todavia é novo. Antes no tempo, eu tinha uma mania besta de querer transformar o platônico e querer torná-lo real, me jogava nesse vasto oceano de ilusões sem máscara ou escafandro. Mas, quando uma vez eu me afoguei quase fatalmente, aprendi a lidar com a superficialidade a meu favor. Me atirem pedras recheadas de frases de efeito do facebook, mas eu aprendi o valor do descartável. Não temos ombros suficientes para carregar todos conosco vida a fora, e ainda há tanta gente a se conhecer...
     Entenda-se, o momentâneo não é sempre ruim, nem sempre precisa ser vazio. Alguns chamam de energia, o santo que bate, vai entender! Mas tem certos encontros que de fato são deveras intensos e duram o tempo que precisam durar, nem um minuto a mais, nem um minuto a menos.
     Sou como uma novela mexicana. Sentimentos, amores, dores, loucuras e dissabores, todos viscerais. Podem ser curtos. Mas, o que é mais curto do que a própria vida humana, afinal? 
     Por fim, isso é uma fase, como tantas outras. Como toda boa mocinha de novela mexicana, eu ainda tenho resquicios de antigas vontades, e sei que hora ou outra vou me apaixonar por um mané qualquer que disser que leu meu blog e amou aquele conto sobre paixões platônicas que eu publiquei certa vez. E eu vou ficar doce doce doce.....

Em tempo: Parabéns atrasado por mais um aniversário, Rodrigo! Que você continue sendo essa gracinha de pessoa por mais 977 anos 

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Ostra Feliz



        Essa semana ouvi um professor dizer algo a respeito de vivermos sob a ditadura do equilíbrio. Nunca fez tanto sentido. Nessa onda de filosofias orientais, o desequilíbrio virou pecado  mortal. Mas o que é equilíbrio afinal de contas, e eu fiquei pensando tanto, por que o equilíbrio, se não vivemos num mundo onde a balança seja igual? 
            Não há castigo, nem recompensa, apenas uma sucessão de acertos e erros, e eu tenho errado tanto e tenho pensado tanto nesses erros, mas não consigo parar de errar. E vou compreendendo mais coisas, foi como se o mundo entrasse pelos meus ouvidos, ultimamente tenho pensado e conversado tanto com tanta gente, são onze milhões que entram e saem do metrô, correm como loucos, vivem como loucos, estressados, a beira de um ataque de nervos, os passos rápidos, e tanta coisa a se refletir e tanta novidade e tanto assombro, tudo tendo que se encaixar a novas formas e novas conexões e novas coisas e novos ambientes e tudo tão fresco mas tão ultrapassado, eu não quero me equilibrar. Não foi do equilíbrio que me vieram as piores coisas que me aconteceram, mas também não foi do equilíbrio que vieram as melhores. Sentimentos, amores, dores, loucuras e dissabores, todos viscerais. 
      Não se sabe o sentido dessa coisa toda estranha que nos fazem chamar de vida, mas a verdade... às vezes dói nos ossos sabe-la, mas no fim todos nós acabamos frustrados, por que vivemos atrás de um equilíbrio impossível, de uma completude imaginária, que se fosse inerente ao ser humano não seria tão impossível de se alcançar. 
      Ostra feliz não produz pérola, ditado meio imbecil, desses que a gente compartilha no facebook, mas tem ressoado na minha cabeça esses dias. Não se trata todavia de felicidade, nem apologia a melancolia. Se trata de intensidade. Descobri que quem nada em águas rasas não se afoga. Simples assim. E nunca produzi tanto. A euforia salva. A depressão também. Há que se sentir, há que ser humano, tanto sangue nessas veias correndo a toa, equilíbrio é soldado marchando pra guerra, na mesma direção fria, as mesmas roupas, os mesmo cabelos, equilíbrio é pasmaceira, a natureza às vezes se cansa de seu próprio equilíbrio e nos manda furacões a arrasar com tudo, maremotos a tirar a calmaria de praias antes pacificas, é preciso cair e levantar, se dilacerar diante do mundo, por que ele é o que é, jamais equilibrado, por que é retrato do próprio homem que o habita.